Inquietação profunda. Foi nesse estado que acordei hoje. Uma inquietação que tem origem na dicotomia entre o que eu sou e o que eu posso ser.
O que eu sou é o que eu fui treinado para ser. Graduação, doutorado, cientista, anos de experiência e tudo dedicado à causa ambiental no país. Me orgulha trabalhar em algo que faz sentido pra mim e para o bem da sociedade. E o mercado me valoriza como profissional e sempre fui bem empregado em setores sem fins lucrativos.
Mas me agonia não ter direito a ser tudo mais que eu poderia ser: fotógrafo, músico, escritor, jornalista, poeta, astrônomo, filósofo, cineasta, botânico, naturalista.
Uma vez qualificado e enquadrado em um perfil, a sociedade dificulta a mobilidade. Com as possibilidades de “ser” presas a salários e a estritas cobranças por experiência em troca de empregabilidade, a sociedade me limita e me sufoca a nunca mais ser outra pessoa. E a própria sociedade limita seus potenciais ao limitar os indivíduos.
Vender trabalho (aka tempo de vida) em troca de possibilidade de sobrevivência em sociedade é a mais brutal forma de controle com o fim único de alimentar um sistema econômico que, supostamente, existe para servir a sociedade.
@jecogeo um palpite para tentar te ajudar com isso é separar o "ser" e o "fazer". Eu acredito que o que somos é um pouco mais do que o que fomos treinados, pois acrescentamos camadas ao nosso ser que vêm das vivências e batem e nossa subjetividade. Ou seja, "somos" também aquilo que não nos ensinaram, mas que acumulamos com nosso viver, de forma consciente ou não.
E aí minha separação. Eu "faço" coisas profissionalmente, mas não necessariamente "sou" aquilo. No dia que não precisar mais fazer, aquilo deixa de fazer parte da minha vida rapidinho (sonho de aposentadoria que nunca chega). Com isso, eu também faço outras coisas. Você pode ser tudo aquilo que você falou, sem estar fazendo aquilo por obrigação ou dependência financeira. E não é papo de "você pode ser o que quiser", porque existem limitações físicas, temporais e financeiras que nos impedem de fazer isso plenamente. Mas podemos ter nossos momentos de fazer o que gostamos, de sermos o que queremos ser. E uma forma de encarar a vida e aproveitar esse conjunto de pequenos momentos e costurá-los da melhor forma que dermos conta.
@aracnus muito bom comentário cara, uma pérola de sabedoria! Hahaha. Brincadeiras à parte, pura verdade. Me fez pensar. Tens toda razão. No cenário em que não se pode mudar o sistema, herdar ou acumular o suficiente para ser “livre”, essa é a melhor costura, como disse @eliasulrich : conectar as pecinhas de ser em meio ao fazer.